12.10.16

Carregue meu Cadáver - Capítulo 13

Hoje fazia quinze anos que seu Joaquim ia ao parque todos os domingos. Seu Joaquim se lembrava da data exata porque ele tinha começado a vir no vigésimo quinto aniversário de casamento junto com sua falecida esposa Marta. Martinha era uma belezinha de mulher e adorava comprar pipocas para dar aos pombos da praça.

Depois de cinco anos separados, seu Joaquim sentia que continuar seus rituais era o que mais o aproximava da esposa. Além dos pombos da praça, Joaquim mantinha o hábito de colocar duas xícaras com desenhos de borboleta quando fosse tomar o café da manhã, mesmo que nunca tinha aprendido a passar o café com o mesmo esmero de Martinha.

Então todos os domingos de manhã, seu Joaquim recolhia o jornal, fazia duas xícaras de café – um com açúcar, outro com adoçante– e resolvia a palavra cruzada enquanto tomava os dois cafés. Depois de se escovar e vestir sua boina, pegava a bengala e descia ao parque.

Comprava pipocas do Augusto, que gostava de chamar o seu Joaquim de doutor – e seu Joaquim gostava de ser chamado de doutor – e se sentava no mesmo banco de madeira pintado de branco exatamente entre o coreto e o riachinho para dar pipocas aos pássaros.

Hoje, no entanto, não dava para sentar no seu banco.

Seu Joaquim nem sabia que os jovens de hoje em dia eram capazes de acordar tão cedo, ainda mais para ir ao parque e sentar no seu banco. Seu Joaquim não via problemas em dividir o banco, mas tinha alguma coisa absolutamente repulsiva no casal.

O rapaz tocava uma música de sua própria juventude no violão para a moça a seu lado. Um bom rapaz. Seu Joaquim não conseguia acreditar que a moça a seu lado tinha qualquer relação com ele.

Obviamente viciada em crack, sua pele era cinzenta e rachada em vários lugares. Ela estava esparramada no banco, com os braços soltos ao lado do corpo e a cabeça pendendo para trás, voltada para o céu. Mesmo à distância, dava para sentir seu cheiro de podridão humana.

Pela primeira vez em quinze anos, seu Joaquim comeu uma pipoca. Comeu uma pipoca e andou alguns metros. Sentou em outro banco, com outra vista para o coreto e a alguns metros mais distante do riachinho. Continuou comendo as pipocas até o fim do saquinho, afinal agora estava instaurada a anarquia.

Do seu novo banco, ainda conseguia ouvir o jovem rapaz cantarolando para sua amiga que mais parecia uma garota de programa barata.

Will you still need me
Will you still feed me
When I’m sixty-four.


Esse é o décimo terceiro capítulo de Carregue meu Cadáver, o livro que estou escrevendo sobre relacionamentos abusivos. Vou postar um capítulo por dia até acabar.

Adoraria saber sua opinião, então deixe um comentário me dizendo o que achou, divida com quem você acha que vai gostar e me cobre se eu parar de postar.

Obrigada!

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