25.10.12

Fluxo

Prometi pra mim mesma que nunca escreveria sobre relacionamentos. Principalmente ex-relacionamentos que deram errado. Parece tão banal, todo mundo faz isso. Mas acho que às 4h30 da manhã, quando você não consegue se concentrar pra estudar e quando não há chocolate o suficiente em casa - e você nem queria que houvesse depois de perder aqueles 10kg, vitoriosa e persistentemente. Mas a gente se sente triste de madrugada. E o motivo de ficar triste é você. É tudo aquilo que você me disse. Que me fez acreditar. Parei de contar histórias por causa de você. Comecei a achar meu português ruim, esqueci como se escreviam as palavras, não consegui dar vida a um personagem. Fantasia pura?, você me dizia, Você deveria escrever realismo fantástico, muito mais interessante. Criticava tudo que eu fazia. Me diminuia até eu acreditar que nunca seria capaz de fazer mais nada. Me fez acreditar que a única coisa válida em mim era meu corpo e mesmo assim insistia em criticá-lo. Me criticar tanto por quê? Medo de quem você é? Medo de ficar ao lado de uma mulher tão ou mais inteligente que você? Medo de as outras pessoas perceberem sua namorada? Medo de que eu escolhesse um deles? E certamente todos eram melhores que você. Cansei de olhar em volta e te comparar a todos os homens da sala e você ser o menos desejável. Olhando para trás, não sei o que vi em você, depois desses anos todos. Acho que gostava da pessoa awkward que você era. Gostava porque fazia eu me sentir melhor também. Alguém tão ou mais estranho que eu. Introspectivo, ruim com as palavras, com dificuldade de se relacionar. E você é assim. Você sabe que é, mas não admite. E não vai admitir nunca. Faz questão de ter milhões de amigos, de mostrar ao mundo o quanto você é melhor que todos eles. Mas enquanto todos os seus amigos foram fazer doutorado no exterior, você continua aqui, na Campinas que você odeia, reclamando que está jogando a vida fora por pesquisar demais e não ter se tornado escritor. Você é bem pior que eu nesse quesito, admita. Eu sempre tentei ser original em tudo, no estilo e tal. Você simplesmente chupava o que gostava, escrevia igualzinho ao João Ubaldo Ribeiro. Que graça tem nisso? Ler o suficiente até decorar e fazer igual. E se dizer gênio em vez de chamar de homenagem. Seus poemas eram ridículos, não queriam dizer nada. No fim acho que foi culpa minha. Me interessei por você porque você gostava de escrever, mas escrevia bem pior que eu, que é a única coisa que eu sei fazer direito. No fim a culpa foi minha por não ter percebido antes. E, mesmo tendo percebido, ter me agarrado a você por medo de não conseguir me sustentar sozinha e de nunca mais encontrar ninguém que gostasse de mim - por mais que você também não gostasse mais de mim. Mas me sinto feliz por eu ter dado um fim a tudo. E, por mais que eu continue com raiva de você e continue sem ter uma pessoa nova, fiz três filmes maravilhosos nesse meio tempo, me reinventei, voltei a usar as roupas que eu gostava e redescobrir minhas músicas favoritas e o tipo de arte mórbida que eu sei que você desprezava. E eu sei que você vai sempre falar de mim pra todas as outras namoradas, do mesmo jeito que você falou da outra pra mim durante 3 anos (Não acredito que perdi tanto tempo.). E no fim eu preferia você mil vezes quando era só um matemático e deixava as divagações sobre a vida e sobre a arte - que, afinal, é minha especialidade - só pra mim.

E você dizia que eu deveria escrever em fluxos, como o Jack Kerouac e sua trupe de beatniks babacas. Cá estou eu escrevendo, mas não consigo deixar de voltar e corrigir. É assim que se escreve, é assim que eu aprendi a escrever e sempre funcionou.