28.8.17

Todas as mulheres da minha família eram loucas


Eu passo os dias desviando dos moradores de rua do centro da cidade. Tem uma moeda, senhora? Por favor, senhora! Nos piores dias puxavam minhas roupas, agarravam meus braços. Não tenho, senhor, me desculpe, não tenho nada. Loucos, todos eles. Coitados, loucos.

Minha vó era louca, me diziam. Tirava as roupas no meio da rua, me diziam. Via coisas, me diziam, estava sempre do lado de lá. Você é igualzinha sua vó, me dizem sempre. As mesmas mãos, o mesmo nariz, a mesma personalidade. Agora que cortou o cabelo, nossa, idêntica. Se ela vivesse numa época mais libertária, ela seria igualzinha a você, me dizem sempre. 

Quanto tempo vai levar até eu também ficar louca?

Eu queria ser dessas pessoas cujo maior medo não é enlouquecer. Entrar em mim mesma tão profundamente que ninguém mais consegue acessar. Virar um jacaré com a barriga tão estufada de suas próprias ideias que quase chega ao ponto de explodir. Quase. Só não explode por compaixão dos funcionários do asilo que olham de longe, passam a mão na cabeça, dizem que vai ficar tudo bem, ela passa os dias dentro da própria cabeça, falando umas coisas que ninguém sabe direito.

Afinal, quais são os limites da mente?

Eu sonhei com você ontem à noite. Não era um sonho, na verdade. Era uma alucinação provocada pelo chá do xamã da floresta. Era uma bebida sagrada, me disseram. Te abre pra mundo novos, me disseram, novos entendimentos de você mesmo.

Agora eu estou convencida de que vejo o futuro.

Eu te vi claramente ontem à noite. Estávamos fodendo como se não houvesse mais nada no mundo. A voz na minha cabeça me disse que você iria me procurar. 

Estou esperando. 
Eu vejo o futuro.

O chá do xamã da floresta também me disse que eu vou enlouquecer. Isso é só o primeiro passo, a voz na minha cabeça me disse. Você vai viver em completo isolamento e ninguém vai te reconhecer, perdida na sua própria mente. 

Estou esperando. 
Eu vejo o futuro.

Um comentário:

Mila Fernandes disse...

Isso parece o primeiro capítulo de um livro que eu leria vorazmente. Com o mesmo título. Por favor.