Fico pensando o que é que vai acontecer primeiro. Se são meus olhos que vão estourar ou minha traquéia que vai pular pra fora. Traquéia, levando brônquios, bronquíolos, pulmões. Tudo que aprendi na aula de biologia há tantos anos atrás. Sinto, além dos arranhões doloridos na garganta, que minha cabeça de repente dobrou de volume. Não apenas de volume, mas de massa. Não, duplicar seria muito pouco. Sinto nele o peso do mundo. Todo o espaço que sobra entre o cérebro e as paredes do crânio devem estar cheios de ranho. Apertando os olhos para fora, por cima e por baixo, forçando saída pelas narinas e pelos ouvidos. Empurram caminho garganta acima, entalando na base, fazendo fila pra sair. Me sinto toda suja, um poço de secreção gosmenta e amarela. Em breve, vai querer sair por debaixo das minhas unhas.
Tosse, tosse, tosse.
E não sei o que é pior. O pó ou a lama. Faziam 63 dias que não chovia. É isso mesmo? 63 dias de poeira, secura, dor de cabeça, necessidade de cremes hidratantes grudentos, com cheiros excessivamente doces, necessidade de água, água, água. Agora a água chegou. Choveu um pouquinho na quarta, na quinta... Eu gosto de chuvisco, de garoa. Não gosto quando chove demais. Parece que a natureza está contra a gente. Água, granizo, relâmpago, trovão que encomoda os cachorros, que insistem em entrar dentro de casa, que sujam a casa porque têm medo de sair, ventania que levanta as telhas, que derruba árvores e paredes de tijolos, tempestade. E tudo parece mais sujo, quando a poiera vira lama, muito mais difícil de limpar dos sapatos, do chão da cozinha, das calçadas.
Tosse, tosse, tosse.
Me recuso a fazer referências a pneumotórax. Mas assumo que tossir desse jeito, há 6 dias sem parar, cansa. Cansa muito.